sábado, 26 de abril de 2014

Tem gente que ainda não acredita nos cartuchos enterrados, então aqui vai a minha explicação longa.
Ao invés de pensar como fã, pense como um empresário. Você tem um estoque de um milhão de cartuchos encalhados (que não tem como vender, boa parte deles já é devolução das lojas que não queriam aquilo ocupando espaço na prateleira).
O que você pode fazer? Já que vender ET não rola, você pode trocar o jogo do cartucho. Mas esses cartuchos usam mask rom, não dá para regravar o chip. Então você precisa tirar o chip do ET, jogar fora, e colocar um chip novo.
Mas não tem máquina que tire solda de chip, você precisa contratar um técnico. Digamos que o cara é muito bom e em dez minutos consegue tirar o chip antigo e colocar o novo. Se ele trabalha 8h/dia, então ele consegue reciclar 48 cartuchos/dia. Para reciclar todos, você precisa de 20 mil homens-dia. Se forem cem técnicos fazendo isso, demora 208 dias (6 meses).
Nesses 6 meses, você precisa de um lugar para guardar os cartuchos enquanto não estão prontos. Então você precisa pagar 6 meses de aluguel e 6 salários para 100 técnicos, fora o custo do chip novo. E ainda tem que trocar a etiqueta, então soma o custo de imprimir um milhão de etiquetas.
Aí você precisa distribuir esses cartuchos, então soma o custo do transporte para levar até as lojas. E aí você precisa torcer para vender esse milhão de cartuchos, o que pode não ser o caso (lembre-se que é 1983, atari já saiu de moda e está chegando o nintendinho).
Em resumo, trocar o jogo do cartucho dá prejuízo.
A opção dois é jogar fora o eletrônico e reciclar o plástico da embalagem. Eu nem sei se existia tecnologia para reciclar plástico em 1983, mas mesmo se existisse, você ainda precisa de alguém para separar o plástico do eletrônico. E você vai vender esse plástico por moedas. Como plástico é barato, pode ser que o salário do cara que vai separar já seja maior que o que você vai ganhar reciclando o plástico (lá não é o Brasil onde você contrata mendigos por centavos para separar plástico).
Ou seja, reciclar o plástico também dá prejuízo.
Por isso, jogar fora tudo é a opção que dá menos prejuízo. E foi isso que eles fizeram, jogaram fora tudo. Ele só foi enterrado porque é isso que se faz com lixo, enterra para compostagem.
Ah, mas se enterraram para compostagem, então os cartuchos deveriam estar acabados e aquela da foto era bonitinho. Só que eles pegaram o melhor deles para tirar a foto! Se você pegar a foto em alta resolução no arstechnica, dá pra ver a penca de cartuchos zoados no lixão (dando zoom eu vi pacman, berzerk, superman, warlords, etc, ou seja era o estoque todo, não tinha só ET por lá).
Clica na imagem pra ver em alta que vale a pena:


Lembre ainda que a lenda não surgiu do nada, ela era documentada! Os jornais da época já tinham falado do dump, por exemplo, essa edição do new york times de 1983 falava em "14 truckloads of discarded game cartridges", ou seja, tinha que ignorar muita evidência para não acreditar na lenda.

2 comentários:

  1. Nunca ouvira falar da lenda, mas eu tentaria uma super-promoção ou doação antes de enterrar. Creio que muita gente ia aproveitar e isso iria até divulgar mais a empresa.

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  2. Na real, o mercado enfrentava uma grande crise em grande parte porque jogos ultrabaratos (e meia-boca mesmo pro padrão do Atari) lotavam os discount bins, inviabilizando as vendas dos jogos melhores (que tinham custos a cobrir). Colocar estes cartuchos no mercado a baixo custo tornaria ainda mais difícil a vida para os outros títulos.

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